Delírio

Depois de dois dias de bebedeira, tento voltar para casa. Mas meu corpo se nega, caio e sou amparado pelo meu único amigo, o chão. Na queda, involuntariamente meus olhos se voltam para o céu. E involuntariamente o arrebol me faz recordar você. Seus cabelos de cor indefinida como o céu que agora admiro, seus olhos que me levariam ao inferno se somente ali pudesse contemplá-los e sua boca que me levaria aos céus se somente ali pudesse beijá-la...
Mas o sol se ergue inexoravelmente, dissipa-se o arrebol e as pessoas que começam a trafegar ao meu lado em direção aos seus trabalhos dissipam meu delírio. Com esforço me despeço do solo e continuo o meu caminho. Porém, diferentemente de outrora, quando carregava apenas o peso do meu corpo ébrio, carrego agora um peso a mais. O peso de saber que por maior que seja meu desejo, seus cabelos, seus olhos, sua boca, enfim, você, sempre estará longe do meu alcance, como o sol que continua a subir...