Depressão

Há vida para um coração que não mais bate?
Se não há vinho suficiente para sedar a alma dormente,
se o sexo não é mais capaz de saciar a carne macilenta,
se o tempo não consegue cessar o sangramento,
por que continuar com o sofrimento?

Toda noite o vento adentra a janela entreaberta
para na minha vigília de solidão
sussurrar seu gélido hálito em meu ouvido
e me fazer relembrar o ardor de seus beijos
que não mais me aquecerão.

Tive a oportunidade de ser feliz
e num poço de egocentrismo a afoguei:
agora pecebo que Narciso não é tão belo
quanto um dia julguei.

Por 27 anos existi,
por 9 meses vivi,
e nesses últimos 7 meses
anseio esperançoso
a morte vir me visitar
numa desesperada fantasia
de com esta dor conseguir terminar.

Se a vida é uma angústia
e nem o pó me faz mais bailar
porque a música continuar cantarolar?

Queria pelo menos uma noite
sua lembrança de minha mente apagar,
escrever aventuras de piratas embebidos de rum
libertos na ilha de concreto a festejar
ao invés de redigir tormentos, lembranças
e notas de suicídio que desejo ninguém encontrar.

Seus lábios me perseguem
nas minhas noites insones,
seu braços me apertam
nas minhas madrugadas de sonhos
e tua falta me consome
todas manhãs em que me levanto.

A cada gole de vinho sorvido
desta imunda taça que sequer tenho forças para lavar,
mais turva minha visão se torna,
mais irreal a realidade se transforma
e a cada instante mais claro fica
que a diferença entre o céu e o inferno
é você.

Queria te odiar: pois entre o amor e o ódio
com o segundo sei melhor lidar.
Não sendo possível, queria ao menos ser poeta
para nesta ladainha
melhor minha dor conseguir expressar.